Skip to content Skip to footer

O despertar do Tigre

Esta é uma linda história indiana, que nos direciona para o autoconhecimento: quem somos, verdadeiramente? Estaríamos vivendo no lugar certo, de acordo com a nossa natureza interior? Naquele para o qual fomos talhados para viver, plenamente, a nossa breve existência aqui na Terra?
Às vezes, precisamos de uma boa sacudidela, dada por um tigre experiente. Sorte a nossa se nos encontrarmos com ele em nosso Caminho!

Era uma vez, uma tigresa prenhe.
Perambulando há muitos dias sem ter sucesso em suas caçadas, ela estava faminta.
– É o nosso fim! – pensou a tigresa, sentindo que não tinha forças para dar nem mais um passo. – Vamos morrer, filho…
Porém, ao ouvir o balido de ovelhas, ao longe, ela sentiu a sua boca salivar.
– Estamos salvos! – pensou a tigresa, cheia de esperança.
Guiada pela fome tão intensa, ela avistou as ovelhas pastando serenamente numa colina, e, sem medir a violência de seu ataque, a tigresa partiu à toda velocidade em busca do alimento salvador.
No entanto, o desespero de sua investida, a velocidade a que se obrigou a desenvolver, e a fúria com que atacou o rebanho, anteciparam o seu parto: de repente, ela se viu com dores atrozes, e acabou parindo o seu filhotinho, bem no meio de sua caçada.
Ao verem a tigresa, as ovelhas se dispersaram, aterrorizadas. Mas, ao perceberem que ela estava caída e não se mexia, as ovelhas foram se aproximando, devagar. Constatando que a tigresa estava morta, elas já iam se afastando quando, de repente, ouviram um miado débil: era o seu filhotinho, que sobrevivera ao nascimento prematuro.
Ao verem aquele recém-nascido tão pequenino e tão indefeso, as ovelhas se condoeram e decidiram adotá-lo. Como mais de uma ovelha amamentava um filhote, elas se revezaram alimentando-o e aquecendo-o. Quando ele atingiu a idade de alimentar-se com grama, elas ensinaram ao tigrinho todos os segredos para se obter a melhor erva do campo. E, assim, o tempo foi passando.
O tigrinho ganhou força e tamanho. Ele foi crescendo e aprendendo a conversar, bem do jeito das ovelhas.
– Beeeeé! – dizia uma ovelha para ele.
– Beeeeeé! – respondia o tigrinho, contente.
Até que um dia, esse rebanho foi atacado por outro tigre. Desta vez, tratava-se de um tigre completamente adulto, fortíssimo, experiente e muito hábil nas artes da caça. E as ovelhas, só puderam correr e balir, desesperadas. Todas fugiram, menos o filhote de tigre, que, estupefato, permaneceu no mesmo lugar de boca aberta, olhando para aquele ser bem parecido com a imagem que via de si mesmo nos espelhos d’água, só que muito maior.
Ao notar aquele filhote de tigre ali parado, fitando-o com tanta perplexidade (mas sem um pingo de medo nos olhos), o tigre adulto esqueceu a sua caçada:
– Quem é você? – perguntou ele, com a sua voz forte e temerária. – O que está fazendo no meio dessas ovelhas?
– Beeeeé! – respondeu o tigrinho, na única língua que ele conhecia.
Indignado, o grande tigre sentiu vontade de devorá-lo.
– Beeeé? O que é isso? Por que você está falando desse jeito?
– Beeeeé! – respondeu o tigrinho, aproximando-se do tigre adulto, e cheirando-o, interessado.
Verdadeiramente ultrajado pelas atitudes daquele filhote, o poderoso tigre pensou em estraçalhá-lo, e acabar com essa conversa insólita, de uma vez. Porém, algo em seu íntimo o deteve. Por sua vez, com fome, o tigrinho começou a comer a grama que crescia macia sob suas patas.
– O que você está fazendo? – bradou o tigre, enfurecido.
Depois, o tigre adulto soltou um rugido de fazer a mais corajosa das ovelhas desmaiar de terror. Com as suas mortíferas mandíbulas repletas de dentes afiados, ele agarrou o tigrinho pelo cangote, e carregou-o velozmente por muito tempo. Quando chegaram em sua caverna, ele o soltou, abruptamente.
O tigrinho nunca havia estado dentro da casa de um tigre verdadeiro, e, maravilhado, começou a farejar aqui e ali, sem nenhum temor diante daquele adulto bravo e com uma fala ainda incompreensível para ele. Fingindo ignorá-lo, o adulto começou a mordiscar os restos do almoço. O tigrinho aproximou-se, porém, ao perceber que aquilo que o tigre adulto estava comendo era, na verdade, algum animal de quatro patas, ele ficou profundamente chocado, e quis fugir para bem longe dali.
– Beeeeeé! Beeeeeé! – berrou o tigrinho, pedindo socorro às ovelhas do seu rebanho, enquanto procurava a saída.
Até que o tigre adulto soltou um rugido tão forte e tão horroroso, que, desta vez, fez o filhote tremer a ponto de não conseguir permanecer em pé. O tigre empurrou os restos da caça na direção do filhote e ordenou:
– Coma!
Ao ver o sangue ainda fresco daquela caça, o tigrinho sentiu náuseas e tentou escapar, sem saber para onde.
O tigre adulto ordenou, novamente:
– Coma!
Sem alternativas, o tigrinho começou a lamber a carne crua e sangrenta com muita repugnância, até que, de repente, alguma coisa despertou dentro dele. Ele abocanhou o primeiro pedaço de carne crua e sentiu as suas mandíbulas triturarem alguns ossos, facilmente. Talvez, o cheiro do sangue, ou a textura da carne, de repente, tenham despertado alguma coisa dentro dele.
O filhote devorou toda a carne que ainda restava colada aos ossos da caça. Estalou a sua língua e lambeu calmamente os restos de sangue de suas patas. Depois, espichou-se preguiçosamente, como nunca o fizera antes. E, sem conseguir controlar ou saber por que agia assim, o tigrinho soltou um rugido gutural, profundo, que reverberou pelas paredes da caverna escura.
O tigre adulto o observava, satisfeito. Para completar os seus ensinamentos do dia, ele disse:
– Venha. Agora, vamos caçar!

Ir ao Topo